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As partilhas extrajudiciais com concorrência do cônjuge casado pelo regime da separação pactuada e descendentes - art. 1829, I, CCB - Artigo do Tabelião titular 14º Tabelionato Ricardo Kollet
26 DE SETEMBRO DE 2025
Embora a análise interpretativa do texto legal – gramatical – esteja em desuso, entendo que é imperioso trazer a letra fria da lei para iniciarmos as ponderações que haveremos de fazer no transcurso do presente.
A redação do inciso I do artigo 1829 do CCB, que lhe foi emprestada pelo Código Civil de 2002, é a seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.
No que diz respeito aos casamentos pelo regime da separação de bens, a base textual do inciso acima reproduzido nos diz que: haverá concorrência do cônjuge com os descendentes, EXCETO se o regime de bens for o da SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS.
É cediço que o regime da separação obrigatória de bens está previsto no artigo 1.641 do CCB, o qual impõe o regime legal aos casamentos: I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
No entanto, o inciso I do artigo 1829, quando excepciona o regime da separação obrigatória, faz menção ao parágrafo único do artigo 1640, CCB, que trata da opção dos cônjuges pelo regime de bens que melhor lhes aprouver: Poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes que este código regula. Quanto à forma, reduzir-se-á a termo a opção pela comunhão parcial, fazendo-se o pacto antenupcial por escritura pública, nas demais escolhas.
Este erro redacional causou dissenso interpretativo, tanto na doutrina quanto nos tribunais, em especial no STJ. Reproduzo abaixo duas decisões da corte em sentidos contrários:
RECURSO ESPECIAL Nº 992.749 - MS (2007/0229597-9) - Direito civil. Família e Sucessões. Recurso especial. Inventário e partilha. Cônjuge sobrevivente casado pelo regime de separação convencional de bens, celebrado por meio de pacto antenupcial por escritura pública. Interpretação do art. 1.829, I, do CC/02. Direito de concorrência hereditária com descendentes do falecido. Não ocorrência.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.382.170 - SP (2013/0131197-7) - DIREITO DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE. HERDEIRO NECESSÁRIO. ART. 1.845 DO CC. REGIME DE SEPARAÇÃO CONVENCIONAL DE BENS. CONCORRÊNCIA COM DESCENDENTE. POSSIBILIDADE. ART. 1.829, I, DO CC. 1. O cônjuge, qualquer que seja o regime de bens adotado pelo casal, é herdeiro necessário (art. 1.845 do Código Civil). 2. No regime de separação convencional de bens, o cônjuge sobrevivente concorre com os descendentes do falecido. A lei afasta a concorrência apenas quanto ao regime da separação legal de bens prevista no art. 1.641 do Código Civil. Interpretação do art. 1.829, I, do Código Civil. 3. Recurso especial desprovido.
Diante das decisões acima transcritas, uma pela não concorrência e outra pela concorrência, como deve proceder o tabelião de notas para outorgar segurança jurídica aos inventários que envolvam os bens jurídicos em tela?
Os inventários extrajudiciais, feitos por escritura pública, são atos eminentemente consensuais. O tabelião somente pode formalizar o ato quando o consenso se estabelece.
Consenso pressupõe acordo formal entre TODAS as partes envolvidas. No caso, todos os sujeitos de direito que, de uma ou de outra forma, tenham direito, ainda que eventual, sobre o bem jurídico que será tutelado no ato notarial
Para além do consenso, o ato ou negócio jurídico entabulado pelas partes deve estar de acordo com o ordenamento jurídico legal.
É importante dizer que o tabelião, ao se deparar com tais situações, nos casos de inventários extrajudiciais, vai lavrar o ato segundo o que for decidido consensualmente pelas partes.
No caso de dissenso, haverá intervenção judicial e o tema poderá chegar aos tribunais.
No caso de se estabelecer o consenso, os advogados das partes encaminharão ao tabelionato as petições com as postulações de todos os herdeiros que compõem o quadro sucessório.
Se o consenso for no sentido de admitir-se o cônjuge casado pelo regime da separação pactuada de bens como concorrente, segue o procedimento normalmente pois o inventário atende o suporte fático do artigo 1829, I, em toda a sua literalidade, formatando-se a partilha com os pagamentos respectivos.
No entanto, se o cônjuge não for admitido como herdeiro, o consenso somente vai ser estabelecido com o seu indispensável comparecimento no ato, na qualidade de anuente ou renunciante.
Neste caso, além de todas as questões fiscais que são de obrigatório enfrentamento nos atos notariais, haverá de ser enfrentado pelo fisco a existência ou não de tributação, uma vez que a ausência do cônjuge no deferimento da herança poderá ser considerada como cessão ou renúncia.
Para além das dissenções doutrinárias e jurisprudências que se estabelecem a partir do tema proposto, entendo que as escrituras de partilha que contemplam o deferimento ou não da herança ao cônjuge casado com o falecido pelo regime de separação consensual de bens, em concorrência com os descendentes, poderão ser formalizadas pelo tabelião de notas, observadas duas questões:
a) Que o cônjuge preterido da concorrência à herança compareça ao ato para estabelecer o consenso;
b) que a questão tributária seja avaliada pela autoridade fiscal, a fim de verificar uma possível tributação.
A busca incessante pela segurança jurídica é o fundamento da atividade notarial e somente será alcançada, no caso em tela, mediante a conjunção de todos os fatores acima.
Ricardo Guimarães Kollet
Titular do 14º Tabelionato de Notas de Porto Alegre
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